quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Mamãe vai ao cinema

Projeto de ONG promove reintegração e lazer após o parto levando mãe e bebê para sessão especial

Passar na entrada de uma sala de cinema e ver mães e pais carregando bebês a tira-colo causa algum espanto, porém esse é o resultado de uma iniciativa de sucesso. Culturalmente, sempre ouvimos que bebês recém-nascidos devem ficar em casa, trancadinhos junto com as mães, até o fim das vacinas, ou o final da licença maternidade. O isolamento visa proteger os bebês do mundo externo; muitas vezes, porém, acaba por prejudicar as mães que, ao longo dos meses, perdem o convívio social e oportunidades de lazer e integração, podendo causar tristeza, ansiedade e até mesmo agravar quadros de depressão pós-parto.

Foi a partir de sentimentos como estes que mães começaram a discutir em uma rede social na internet, em 2008, a possibilidade de promoverem lazer sem deixar a companhia de seus bebês. Irene Nagashima, cinéfila e idealizadora da ONG CineMaterna, por uma necessidade pessoal sugeriu que “invadissem” uma sala de cinema em São Paulo durante a semana. Lutar contra o isolamento social e voltar a ir ao cinema, depois de meses, foi principal mote.

“Já fazia cinco meses que não ia ao cinema. Eu sou cinéfila, pra mim era a morte ficar presa em casa, não poder fazer o que gosto”. A iniciativa deu certo. As mães continuaram a se reunir semanalmente para assistir aos filmes e tomar um café logo em seguida à sessão. Segundo Irene, no primeiro encontro o papo na cafeteria durou quatro horas. O grupo cresceu, tomou forma, virou uma ONG. Seis meses depois já estavam na agenda cultural da cidade de São Paulo.

A CineMaterna (http://www.cinematerna.org.br) já está presente em quatro estados do País (São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Bahia). Conquistou, desde o seu surgimento, espaço privilegiado nos cinemas. A ONG promove encontros semanais em diferentes cinemas, sempre nas primeiras sessões das salas. As luzes são mais amenas, o som mais baixo. São disponibilizados trocadores, fraldas, lenços umedecidos, tapetes para as crianças engatinharem e, em breve, brinquedos.

Segundo Irene, nos primeiros meses de vida do bebê, a atenção de toda a família se concentra na criança, e a mãe acaba por ficar de escanteio com suas dúvidas e inseguranças peculiares a esta nova fase de sua vida, podendo, inclusive, prejudicar seu elo com o filho. “Nossa maior preocupação é o vínculo da mãe com o bebê. A reintegração social e cultural traz ganhos aos dois, mas o maior ganho é o convívio familiar. A mãe estando feliz, satisfeita, desenvolve uma relação mais saudável com o bebê”, avalia.


Como funciona


As mães interessadas em participar da iniciativa podem proceder de duas formas. A principal é ir às sessões para conhecer outras mães e trocar experiências, dúvidas e, claro, assistir ao filme. Além disso, podem se cadastrar no site da ONG para receber semanalmente a enquete que deve escolher o filme da semana seguinte.

As cadastradas recebem por email três opções para votação. O filme mais votado é o escolhido para a sessão. Como o foco é a mãe, 98% dos filmes exibidos são para público adulto. A exceção ocorre nas férias escolares, pois a exibição de filmes infantis promove o convívio da mãe e bebê com os filhos mais velhos.

Reintegração e bem-estar

Segundo o Dr. Joel Rennó Jr, Diretor do Programa Saúde Mental da Mulher (ProMulher) da Faculdade de Medicina da USP, transtornos de ansiedade e depressivos do pós-parto costumam ocorrer entre 10% e 20% das mulheres e podem ser desencadeados por diferentes causas. Há o fator hormonal, devido à queda abrupta de hormônios femininos, e também os de ordem psicossociais.

Os psicossociais podem estar atrelados a um baixo nível socioeconômico, a um histórico familiar ou pessoal de depressão ou violência, uso de álcool e drogas, ou até mesmo ao não planejamento da gravidez em questão. Além disso, muitas mulheres queixam-se de não se sentirem capazes de cuidar de seus filhos; outras de se sentirem culpadas por eventuais erros, muitas vezes normais nos primeiros cuidados com o recém-nascido. Conforme o especialista, estes fatores precisam ser desmitificados o quanto antes, a fim de garantir o bem-estar da mãe e do bebê.

O psiquiatra, também membro-fundador da International Association for Women's Mental Health (Associação Internacional para a Saúde Mental das Mulheres), afirma que na maioria das vezes o cuidado pode ser construtivo na relação e construção do vínculo entre mãe e filho. “A amamentação deve ser também orientada e incentivada, de forma a não gerar um estresse através de uma obrigatoriedade generalizada, mesmo quando a mulher tem muita dor e falta de leite, por exemplo”, destaca.

Para assegurar a tranqüilidade mental e a reintegração das mães, Rennó ressalta que suportes psicológico e afetivo são fundamentais. “Familiares próximos devem ajudar nos contatos iniciais da mãe com o bebê, colaborar na prática das atividades diárias a fim de diminuir o grau de estresse para a mamãe”, pondera. Dessa forma, o CineMaterna vem também com recomendação psiquiátrica. “Toda ação de reintegração social da mãe junto ao bebê costuma ser benéfica, sendo mais um dos fatores que minimizam o risco do impacto do estresse no possível desencadeamento de transtornos mentais”, avalia.

Amanda Voltolini in http://guiadobebe.uol.com.br/

Nenhum comentário:

Postar um comentário